Ouvi do Carlos Martins que a minha memória está me traindo, que o basquetebol do Mackenzie, com Radvilas, Victor e Moutinho, nos idos dos ‘60, não era imbatível, nem tão mais forte que o nosso quinteto. Que perdíamos, invariavelmente, é verdade, mas com diferença de pontos não tão grande, etc. Sem contar, ainda, a nossa festejada conquista de 1968 – ganhamos o basquete da MACMED (!) – já contada por ele mesmo. Melhor assim, que eu esteja esquecido!
Na versão anterior (ano 67), na mesma MACMED, algo ocorreu, em partida não acabada de basquetebol… Preciso relatar, até porque andei escutando versões outras, não condizentes com os fatos ocorridos…
Tudo começou numa terça feira, no ginásio do Pacaembú, quando, durante toda a partida do voleibol, eu permaneci sentado no banco de reservas, que se situava “do lado de lá”, bem ao pé da torcida dos inimigos – e como foi duro! Eu era um agitador reconhecido e “marcado” pelos “filhinhos de papai”. Os caras “me adoravam”! Não posso negar: enchia o saco deles, mesmo!
Bolas de papel de jornal me foram atiradas, tapinhas na cabeça e uma série interminável de provocações na minha orelha – tive que aturar todo o tempo, já que não joguei sequer um instante. Como se não bastasse, eles atiraram uns 2 ou 3 tomates na quadra nos momentos que o time da MED “engrossava” a partida – foi um jogo muito equilibrado e “arriscava da gente ganhar”, mas não deu, a vitória foi deles.
Fiquei muito frustrado e “p” da vida! “Eles não jogaram limpo, vai ter volta”, pensei! E meti na minha cabeça: “depois de amanhã, na quinta, haverá o basquete e não teremos a menor chance… pois bem, esse jogo não vai terminar”!! Não só pensei, falei alto, comentaram, chegou aos ouvidos do Egídio, dirigente da competição – ele não se lembra, mas veio falar comigo, qualquer coisa assim: “não apronta, meu! O que vale é competir, vamos participar com dignidade e espírito esportivo”. Mas eu estava decidido, que se lixassem os princípios do Barão de Coubertin!
Não me lembro quem foi comigo (Ranoya? Mais provavelmente, Marito; ambos no céu, não poderão ajudar a recordar), saímos às compras, trouxemos exatas 64 dúzias de ovos! Uma grosa de ovos de galinha!! Foram devidamente acondicionados dentro dos instrumentos de percussão de nossa torcida (que eu dirigia…) e levados a tiracolo ao mesmo ginásio do Pacaembú, para uso durante a partida; os organizadores, preocupados com nossas tramas, haviam solicitado à polícia “reforço da segurança” para aquela 5ª feira – lá estavam dois guardas civis… lembram, aqueles de farda azul e botões dourados? Apesar de estarem “de olho na gente”, entramos sem que nos molestassem; nem de longe desconfiaram de nós ou dos surdos da bateria!
O ginásio estava repleto! O maior publico que a MACMED jamais tivera, graças, também, à partida preliminar de basquete que haveria, entre os cursos Anglo-Latino e Objetivo do João Carlos Di Gênio (48ª turma), já com grande sucesso em seu segundo ano de existência. Muito entusiasmo daquela moçada que almejava sucesso no vestibular que se aproximava e muita expectativa nas torcidas de MAC e de MED, pela “partida de fundo”, sobretudo pela presença dos jogadores citados, todos da seleção brasileira.
Nossa valorosa equipe, “da AAAOC, de todos os esportes, a que mais treinava”, prometia lutar muito pelas cores da MED; os atletas Alexandre Kiss, Carlos Martins, Waldir Pricoli, Luiz Carlos Junqueira, Waldir Cipola, Joel De Mello Franco, Marcus Ranoya, entre outros, almejavam por uma vitória quase inatingível.
Bem, finda a partida dos vestibulandos, inicia-se a esperada partida principal.
Nossos “grandes pivôs“ não passavam da altura do ombro do gigante Radvilas! A coisa estava difícil, impossível mesmo, Eles dominavam amplamente as ações. Aí, no segundo tempo, quando a contagem estava algo como 36 a 12 a favor deles, eu, certo de nossa derrota, passei uma giletezinha no couro do surdo e “libertei os produtos da granja”… fomos espalhando aqueles “projéteis” entre nossa torcida: marmanjos, senhoritas, senhoras, TODOS, devidamente municiados com aquele armamento, dois a três ovos em cada mão!! Ao mesmo tempo, passaram-se os recados ao pé do ouvido, ninguém lança até que seja dado o sinal, vamos jogar todos juntos!
E assim foi. Em certo momento, a torcida mackenzista levantou-se entusiasmadamente na comemoração de mais uma cesta, e nós gritamos: AGORA! Que espetáculo memorável! Uma nuvem branca, 144 ovos arremessados para o outro lado, potência de tiro variável, uns que atravessavam todo o ginásio para atingirem a parede do outro lado, outros oriundos de braços menos poderosos, vôo mais curto, caindo na quadra, de forma que todos, atletas e árbitros, torcedores e agentes de segurança, TODOS, devem ter sido atingidos. Rolou um pau que deu gosto! Foi tapa, safanão, empurra-empurra pra todo lado! Muitos derrapavam na quadra, se estatelavam mesmo, já que a ovação transformou o piso numa escorregadia omelete! Lindo mesmo!
Como tudo que é bom acaba bem, entre mortos e feridos escaparam todos! A “turma do deixa-disso”, os dirigentes, a policia, conseguiram serenar os ânimos e deixamos o ginásio, derrotados na partida, é certo, mas com a alma lavada, por termos realizado a maior ovação já havida em um ginásio de esporte!!
Podem acreditar que esse relato é a pura expressão da verdade.
Nunca pedi desculpas por essa minha trampolinagem, mas não serei hipócrita a ponto de dizer que me arrependo dela.
Fiquei sabendo, após o transcurso de meio século, no Encontro de Gerações/2017, que após sujarmos daquela forma a dependência pública, corremos sério risco de não termos o espaço cedido para as competições seguintes. Como se resolveu o impasse? O incansável Egidio Correia Da Costa Arruda, horas depois de finda a partida e a ovação, retornou ao Pacaembú e, SOZINHO, FEZ A FAXINA DE TODO O ESPAÇO!
Falta perguntar: onde fica a estátua de bronze para glorificar esse colega emblemático?
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Uma beleza de relato, Xará. E do Egídio, o que seria de se esperar, senão essa atitude? Daí nossa alegria por termos encontrado o grande Egídio, no último “Encontro de Gerações”. (Eduardo Verani – out/2017)
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Eu estava lá, assistindo com meu amigo de adolescência no interior, o Bacurau. Ele, do Mackenzie e eu, da Medicina. Ficamos estarrecidos com aquela nuvem de ovos passando sobre nós, imagem que nunca se repetiria em nossas vidas. Mas, no fim, ambos achamos engraçado. Saímos para uma cerveja. Éramos dois amigos. Mais que torcedores adversários. (Domingos Lalaina Junior – out/2017)
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Genial “Parceiro” Berger. Acho que muitos depoimentos com o do Lalaina vão aparecer. Egidio Correia Da Costa Arruda, vamos lá. O esporte da 52a foi forte em todas as modalidades e na direção. Vc foi nossa referência. Necessitamos mais fatos, histórias e relatos. Escreva sobre o futebol. Devo falar sobre o tênis. O remo, voleibol e basquete já se manifestaram. “Nossas Memórias” aguardam novos relatos. Décio, Murilo, e os seus relatos? (Roberto Anania de Paula – out/2017)
Bela lembrança.
Participamos desta heroica batalha e como sobrou alguma munição continuamos a “ovação” até a casa do Paulinho Szeles lá nos Campos Elizios.. Bons tempos da fase “muito hormônio, pouco neurônio”.