Julho, 1968… em Portugal, poucos anos antes da Revolução dos Cravos.
Lisboa, Bairro de Alfama com suas lojinhas coloridas e o caminho do Castelo de São Jorge.
Tínhamo-nos perdidos uns dos outros, encantados com os arredores cheios de jovens – afinal eram férias e, na Europa, os get together reuniam estudantes dos mais variados cantos do mundo. Aqui não era diferente…
Numa pequena praça tocavam músicas portuguesas. A voz de Amália Rodrigues, com seus encantos e lamentos, preenchia cada cantinho daquele espaço. E nos procurávamos, uns aos outros, nas diversas línguas que se ouviam.
Num ponto da praça, num local mais alto, um grupo de jovens vestidas com roupas tradicionais, observavam o alegre ambiente. Suas indumentárias típicas sugeriam que haveria um show. O colorido de suas vestes davam-lhes um toque mágico!
Comigo estavam alguns portugueses curiosos de saber algo do Brasil. O fado de Amália dava um toque nostálgico, com seus lamentos descrevendo amores que se foram para paragens ultramarinas. Corações despedaçados eram descritos naqueles versos de jovens abandonadas – mas eu não estava afim de que aquele canto triste evoluísse, prejudicando a minha noite.
Uma das jovens, com os tradicionais trajes acima descritos, estava mais apartada do grupo e como nada acontecia, ora pois, resolvi eu mesmo acontecer. Nada a perder! Vamos a luta! Em 99% das vezes “eu saia de mãos vazias”, mas sem que tentasse o 1% de chance, jamais sorriria para mim a alegria da conquista!
Lá fui eu: a aproximação foi promissora, a bela dama deu um sorriso que iluminou-me a alma, levantou-se, fez uma mesura clássica que me desconcertou de vez… eu nunca esperaria uma atitude daquela! Aquela em que um pezinho vai para traz, o joelho dá uma dobradinha, as duas mãos seguram as pontas da saia, e ela desce absolutamente erecta!!!! Ai, Jesus, que eu morro!
Olhos nos olhos, uma verdadeira princesa. E… sentou-se de cabeça baixa! Sentei-me ao seu lado sem saber que atitude tomar e ela me disse:
-“Gostaria de estar contigo, mas não posso”.
Neste instante, um dos gajos que estavam a observar-nos, veio a nosso encontro e me disse:
-“Ó, Pá! Estas raparigas com roupas tradicionais são viúvas de guerra, estão de luto por terem oferecido seus maridos à Pátria!”
Ela não tinha 20 anos!!!
Estavam em plena Guerra Colonial na África!
Foi-se minha noite… mas, convenhamos, por causa justa!
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Nota do Editor
A ditadura ultra-nacionalista em Portugal sobreviveu por mais de 40 anos, inclusive após a morte de seu líder, o radical Antonio de Oliveira Salazar! Ele não aceitava e não admitia que o Estado Português fosse chamado de colonialista. “Não temos colônias – dizia ele -, são Províncias Ultramarinas.
Daí, ele chamava de Guerra do Ultramar – 1961 a 1974 (nunca “colonial”), a inútil e sangrenta luta que custou tantas vidas a Portugal e às suas colônias, Angola, Moçambique e Guiné Bissau, que obviamente acabaram por declarar suas independências, após 400 anos de opressão.
90% da população jovem masculina de Portugal lutou na Guerra Colonial!
10 mil morreram, 20 mil ficaram inválidos!
Mais de 100 mil vítimas entre os civis que viviam nas colônias!
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Flávio e suas paqueras. Será que um dia contou quantas foram? Acho que D. Juan ficaria com inveja.
Brincadeiras a parte, os europeus trouxeram muita desgraça no mundo, em nome de religião e da “civilização “. Os incas e maias que o digam
O Berger fez um bom serviço na edição de meu texto. Foi uma aventura interessante no Bairro de Alfama em Lisboa.
Uma pena que a jovem estivesse de luto… Não pude consolá-la!
Foi-se sua noite…mas, convenhamos, poderia ter perdido seus “documentos” pela foice da implacável justiça colonialista.
Bela história Flávio.
Descrição perfeita e nostálgica de uma “aventura” em Lisboa.
Bela lembrança.