sexta-feira, outubro 18

VELOZES E FURIOSOS, Domingos Lalaina Junior

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Ninguém esquece.
O hospital, um modelo.
Instituto de Psiquiatria Comunitária, sob minha direçào.
Os pacientes, uma vez sendo internados, ao recair, voltam por sua escolha.
Ele é inesquecível. Bipolar, internado algumas vezes em euforia franca, divertidíssimo, carismático, cativa a todos.
Viúvo, cinquentão, boêmio, mora com dois filhos, que pedem para buscá-lo. Recusa medicação, está novamente em surto eufórico, não dorme, passa noites fora de casa, volta com mulheres, e por aí afora. Como resiste à internação, os filhos querem aproveitar o momento, pois, embriagado, é fácil ser levado.

A ambulância vai com dois funcionários que o conhecem e de quem ele gosta, motorista e enfermeiro.
Fazê-lo entrar na ambulância é fácil, ele pega ambos pelos braços, são seus amigos, e coisa e tal. Põe, entretanto, sua  condição. Parar no bar em frente ao hospital e tomar um cafezinho com eles. Em vista da docilidade, ambos concordam. Isso vai reforçar o bom relacionamento entre ele e a equipe terapêutica.

O caminho para a clínica transcorre sem incidentes. Ao chegar, ambos vão pegá-lo.
Tranquilo, pede ajuda para descer do veículo. Quando lhe dão as mãos, subitamente, forte que é, puxa ambos para dentro da ambulância e, ágil, salta para fora e fecha a porta, que, por segurança, não pode ser aberta por dentro, deixando os dois presos na parte traseira do veículo.

Rindo, corre e senta-se à direção.
A chave, ele deve ter visto, está no contato.
Sai, eufórico, cantando, zombando dos pobres coitados, fazendo peripécias no volante, rodando pelo bairro por quase uma hora, ignorando as súplicas dos seus dois “pacientes”.

Enfim, satisfeito, volta ao hospital, calmamente desce, abre a porta traseira, vai à entrada da clínica e toca a campainha.
Entra calmamente, com o riso solto.
Procuro conter o meu.

2 comments

  1. ALZIRA TEIXEIRA CLAUZET 5 setembro, 2018 at 17:47 Responder

    Fantástico Dr. Lalaina parece que estamos vendo ele entrando no Hospital com aquele sorriso característico. Fantástico!

  2. Eduardo Berger 5 setembro, 2018 at 19:14 Responder

    O relato traz à realidade situações absolutamente verdadeiras. VIVA A LOUCURA!!! Contrariamente à população em geral, de louco temos um pouco… mas de médico, temos muuuito!!

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