O curso de propedêutica iniciou-se em 1966 sob a coordenação do Prof. Bernardino e uma enfermaria de Propedêutica Geral foi inaugurada no sexto andar.
Alguns colegas da 52ª foram convidados como voluntários: Pereira Barretto, Murilo, Anania e outros. Fomos também requisitados para trabalhar como “assistentes” do consultório privado do Professor Bernardino e do seu irmão João Tranchesi, também assistente do Hospital das Clínicas e conhecido pelo seu livro de eletrocardiograma.
Nossa função era tirar a história do paciente, fazer um eletro e apresentar aos professores. Em seguida, eles eram consultados pelos mestres. Usávamos gravata, avental e, ao fim do expediente, a secretária fazia o pagamento em dinheiro, segundo o número dos atendimentos. Confesso que não era nada desprezível e assim começamos nossa vida “profissional”. Com o tempo, fomos ganhando confiança, passamos a discutir os diagnósticos e dar os primeiros passos na leitura dos eletros.
Os irmãos eram “fanáticos” esportistas e torcedores da Mac-Med. Nos jogos de futebol no Pacaembú, ficavam junto ao alambrado, torcendo e insultando os mackenzistas.
Como jogavam tênis, me convidaram a jogar com eles no Pinheiros. Me pegavam na pensão que morava e não faltavam elogios quando jogávamos. Não era por menos, devolvia as redondinhas nas “mãos” e era evidente que podiam bater melhor. Também fazia parte do grupo o Professor Nesti.
Com o tempo, Pereira e Murilo foram ser cardiologistas e decidi fazer cirurgia.
Reencontrei o Professor Bernardinho numa situação dramática. Ele se achava um pouco cansado e anêmico e resolveu fazer exames. Na época, existia o laboratório clínico e alguns exames radiológicos. Resultado: anemia e hematúria. Procurou então o Professor Campos Freire, da Urologia e fez uma urografia excretora que mostrou o rim esquerdo disforme e deslocado. Ninguém o examinou. Era professor de Propedêutica e, com o diagnóstico de “tumor renal”, foi realizada uma lombotomia. Resultado: rim esquerdo normal e esplenomegalia!
Convocado à sala de cirurgia, o Professor Arrigo Raia não titubeou. Fez uma laparotomia exploradora e, com diagnóstico de cirrose hepática descompensada com ascite, fez esplenomegalia e desconexão ázigo-portal. Na evolução, o Professor Bernardino apresentou hematêmese e foi necessário balão de Sengstaken-Blackmore. Em seguida, aspirou secreção gástrica, foi entubado, traqueostomizado e ficou num quarto com cuidados intensivos, no oitavo andar. Sedado e em coma hepático voltou a sangrar.
Nesta ocasião, eu estava de plantão no PSC à noite e o Professor Arrigo me pediu para ficar com sua esposa no PS, pois tinha uma junta médica à respeito do Bernardino. Passa meia, uma hora, e a Sra Raia me questiona da demora do marido. -”Sra, a situação do Professor Tranchesi é muito grave e a junta deve estar ainda reunida”. Mais meia hora e diante do olhar de súplica da Sra. Raia, resolvi subir. O Dr. Raia já tinha deixado o hospital com os demais mestres e foram continuar a reunião num restaurante… Tinha esquecido a mulher! Voltei, comuniquei o fato e me prontifiquei a levá-la em casa. E assim o fiz até o Sumaré.
E também assim terminou a vida do meu querido amigo e HOMENAGEADO DA 52ª TURMA: O PROFESSOR BERNARDINO TRANCHESI.
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Bela e triste história, Anania.
Gostava muito dos irmãos Tranchesi e com eles aprendi muito. Mesmo depois de já formado , continuei trabalhando no consultório deles, por algum tempo.
Agora, uma historinha mais leve. Não sei se os colegas irão se lembrar:
Aula com o Professor João Tranchesi, que evidentemente, só poderia ser sobre Eletro. Os eletros iam sendo projetados e éramos convidados a interpretá-los. O Dr. João com uma vara na mão, ia mostrando os principais dados dos mesmos. Em determinado momento, chama um de nossos colegas – não lembro qual, e diz-solenemente: “Não sei se poderei dizer que lhe passo a vara”. O anfiteatro desabou em risadas e aula acabou… (Murilo Pereira Coelho – 2017)