A RECOMPENSA DO HERÓI, Domingos Lalaina Junior
Sexto ano de Medicina. Hospital das Clínicas. Internato. Obstetrícia.
Eu e Mammana, internos, auxiliamos D’Andretta, Residente.
Trabalho de parto custoso. Parto demorado, difícil devido à circular de cordão. Conseguimos terminar quase à meia-noite.
Puxa minha manga.
– “Doutor, estou com fome.”
Indigente, vinda da rua, esgotada, sabe-se lá quando comeu pela última vez.
A essa hora, a enfermagem não consegue nada.
O Hospital serve, à meia-noite, um bife com salada de tomate, para o pessoal de plantão. O chamamos de Bife da Meia-noite. Assim mesmo, com maiúsculas.
A pausa relaxante.
A recompensa do herói de plantão.
Todos sempre vamos, com satisfação, comê-lo.
Pena da infeliz mulher….
A idéia vem.
– “Vou lhe trazer uma coisa para comer.”
Vamos para o Bife da Meia-noite. Comemos, conversamos. Faço um sanduíche de bife e tomate e levo, embrulhado num guardanapo.
Ela mastiga e pára.
– “Desculpe, doutor, mas não dá.”
Recusa o bife. Com minúscula.
A pobre indigente não consegue comê-lo.
O nosso Bife.
Fico pensando…
O prêmio do herói de plantão não é o Bife, é o aprendizado. O Bife é o diploma, como o diploma, escrito em pergaminho, que não passa de couro. Temos estômago para o que fazemos e dentes para mastigar o diploma.
Ela, infeliz, não.
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Inesquecível bife-da-meia-noite – a vida era dura, a carne também, mas a gente era jovem e feliz!
Sábias palavras.
… e os dentes saudáveis!
Vocês não tem ideia de como é o lanche da meia noite que é servido hoje para os plantonistas: bolacha água e sal e suco! Não é a toa que nas cercanias do hospital está cheio de lachonetes e de pizzarias. Saudades do Bife da Meia Noite.
Verdade! É o diploma. Uma noite cheguei tarde e o Bife da noite tinha acabado. Estavam lavando aquelas enormes panelas. Em pé dentro dela, uma vassoura e uma mangueira. No dia seguinte, o Bife estava gostoso da mesma forma !!
Revendo o site, vi que a minha historinha a respeito do bife não tinha saído. Reenvio então:
O melhor bife que já comi
Falando em Bife da Meia Noite, lembrei-me de um episódio que ocorreu comigo quando sextanista, interno da Cirurgia. Acordava cedo, era um dos primeiros da fila para o café da manhã, uma cumbuca de leite com café e um sanduíche de queijo, se me recordo. Comia correndo, ia para enfermaria, evoluía os pacientes, arrumava os curativos, para que, as 8hs o residente pudesse passar visita e preparar o caso para o assistente. Na visita deste, os curativos, cudadosamente feitos, eram arrancados para que o médico pudesse ver a cicatriz. Obviamente, após a visita, o curativo tinha que ser refeito. Daí a gente corria para fazer o que se decidia na visita, ia “cavar” os exames solicitados ( imagine hoje, mandar um interno “cavar” exames – escutaríamos uma preleção de “meus direitos”), tirar história dos novos internados, pedir “exames de rotina”, incluindo, obrigatoriamente, exame de fezes e à noite ir para o plantão de Pronto Socorro. Uma noite, estava eu como instrumentista de uma cirurgia de emergência à meia noite e, de repente, vi tudo escuro. Acordei com um monte de gente olhando para mim e o residente-cirurgião me chamando de interno peripacoso. Felizmente, um outro residente presente perguntou-me se tinha jantado. Respondi que não. E almoçado? Não. Não tivera tempo. Novas broncas, mas sugeriram que descesse e comesse o bife. Fui. Nunca comi um bife tão gostoso. Nem lembro se estava duro
PS. Quem me substuiu foi o Funabashi – ele ficou sem o Bife